O artigo 2º do Código Penal Militar (CPM) e a Constituição Federal (CF) estabelecem diretrizes claras sobre como lidar com o conflito de leis penais no tempo, garantindo que a justiça seja aplicada de forma equitativa e respeitando os direitos fundamentais. Vamos explorar cada uma dessas hipóteses em detalhes:
1. Novatio Legis Incriminadora:
- Conceito:
- Ocorre quando uma nova lei criminaliza uma conduta que antes era lícita.
- Por força do princípio da irretroatividade da lei penal, consagrado no artigo 5º, XL, da CF, essa nova lei não pode ser aplicada a fatos ocorridos antes de sua vigência.
- Implicações:
- Essa regra visa proteger os cidadãos de serem punidos por atos que não eram considerados crimes no momento em que foram praticados.
- Garante a segurança jurídica e a previsibilidade das consequências das ações.
2. Abolitio Criminis:
- Conceito:
- Ocorre quando uma nova lei descriminaliza uma conduta, ou seja, retira seu caráter criminoso.
- Nesse caso, o crime e seus efeitos penais desaparecem, extinguindo a punibilidade do agente (art. 123, III, do CPM).
- No entanto, os efeitos civis, como a obrigação de reparar danos (art. 159 do Código Civil e art. 109, I, do CPM), permanecem válidos.
- Implicações:
- Reflete a mudança na concepção social sobre a gravidade de certas condutas.
- Evita a aplicação de punições desnecessárias ou injustas.
3. Novatio Legis in Pejus:
- Conceito:
- Refere-se à criação de uma nova lei mais severa que a anterior (lex gravior).
- Assim como na novatio legis incriminadora, a lex gravior não pode ser aplicada retroativamente.
- Implicações:
- Garante que as pessoas não sejam surpreendidas com punições mais severas por atos já praticados.
- Exemplo: a Lei 9.839/99, que restringiu a aplicação da Lei 9.099/95 na Justiça Militar, não pode ser aplicada a crimes anteriores à sua vigência.
4. Novatio Legis in Mellius:
- Conceito:
- Ocorre quando uma nova lei é mais favorável ao agente (lex mitior).
- Nesse caso, a lei nova retroage para beneficiar o agente, mesmo que já exista sentença condenatória.
- A lei mais favorável pode ser aquela que comina pena mais branda, elimina agravantes ou reconhece novas causas de exclusão da ilicitude.
- Implicações:
- Reflete a evolução do sistema penal em busca de maior justiça e proporcionalidade.
- Garante que as pessoas sejam punidas de acordo com a lei mais benigna.
5. Competência para aplicação da lei nova:
- Condenação transitada em julgado:
- A aplicação da lei nova compete ao juiz da execução.
- Na Justiça Militar, a execução da sentença é de responsabilidade do Juiz-Auditor da Auditoria ou do Presidente do Superior Tribunal Militar (arts. 588 e 590 do CPM).
- A Lei de Execução Penal (Lei 7.210/84) também se aplica aos presos da Justiça Militar.
- Processo em curso:
- A aplicação da lei nova cabe ao juiz ou tribunal responsável pelo julgamento.
- Na Justiça Militar Federal, a competência é das Auditorias das Circunscrições Judiciárias Militares ou do Superior Tribunal Militar.
- Na Justiça Militar Estadual, a competência é das Auditorias Militares ou dos Tribunais de Justiça.
6. Jurisprudência:
- Súmula 611 do STF:
- "Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação da lei mais benigna."
- Essa súmula reforça a importância da aplicação da lex mitior, mesmo após o término do processo.
- Decisões do STJ:
- Confirmam a competência do juízo da execução para aplicar a lei mais benigna em casos de crimes militares.
- Esclarecem que a execução da pena de militares em estabelecimentos penais estaduais segue as normas da execução penal comum.
Em resumo, as hipóteses de conflito de leis penais no tempo são resolvidas com base nos princípios da irretroatividade da lei penal e da aplicação da lei mais benigna, garantindo a justiça e a segurança jurídica.
0 Comentários