O Juramento de Hipócrates é um juramento solene feito por médicos em sua formatura, comprometendo-se a praticar a medicina com ética e profissionalismo.
História e Origem:
- Atribuído ao médico grego Hipócrates (460-370 a.C.), considerado o "pai da medicina".
- Datação incerta, possivelmente escrito no século IV a.C.
- Originalmente escrito em grego antigo, diversas traduções e adaptações ao longo dos séculos.
Conteúdo do Juramento:
- Invocação de deuses e deusas relacionados à medicina (Apolo, Esculápio, Higeia e Panaceia).
- Compromisso com os princípios éticos da medicina:
- Respeito aos professores e colegas.
- Cuidado com os pacientes, priorizando sua saúde e bem-estar.
- Confidencialidade das informações dos pacientes.
- Recusa em praticar eutanásia ou aborto.
- Transmissão do conhecimento médico para as futuras gerações.
- Finalização com uma bênção: "Se eu cumprir este juramento com fidelidade, que me seja dado gozar felizmente da vida e da minha profissão, honrado para sempre entre os homens; se eu dele me afastar ou infringir, o contrário aconteça."
Importância e Relevância:
- Marco histórico na ética médica, definindo princípios que norteiam a profissão até hoje.
- Símbolo do compromisso dos médicos com a responsabilidade social e o cuidado com a vida.
- Inspiração para a criação de outros códigos de ética médica em diferentes países.
Atualizações e Adaptações:
- Ao longo dos anos, o Juramento de Hipócrates passou por diversas adaptações para se adequar às mudanças sociais e científicas da medicina.
- Algumas sociedades médicas optam por utilizar versões modificadas do juramento original, enquanto outras preferem outros juramentos ou declarações de princípios éticos.
Críticas e Reflexões:
- Alguns aspectos do juramento, como a invocação de deuses e a recusa em praticar eutanásia ou aborto, podem ser considerados ultrapassados ou controversos em algumas sociedades.
- Importante refletir sobre os princípios éticos da medicina e adaptá-los à realidade social e cultural de cada época.
Exemplos de adaptações do Juramento de Hipócrates:
- Declaração de Genebra da Associação Médica Mundial (1948)
- Juramento de Maimônides (século XII)
Conclusão:
O Juramento de Hipócrates, apesar de ser um documento antigo, continua a ser um importante símbolo dos princípios éticos da medicina. É um compromisso com a responsabilidade social, o cuidado com a vida e a busca constante pelo conhecimento e aperfeiçoamento profissional.
Fontes
Ovídio Rocha Barros Sandoval, Vice-Presidente do
Conselho Consultivo da FAEPA
considerações iniciais. |
1.
Em busca de minha formação
humanística e jurídica, sempre me dediquei aos estudos de Filosofia e Ética,
desde o já longínquo ano de 1958 quando ingressei na Faculdade de Direito.
No
campo da Ética, sempre me impressionou o contido no “Juramento de Hipócrates” que os acadêmicos de
Medicina renovam a séculos e em todo o mundo, antes de dar início à sua
profissão. Aliás, juramento que não existe, pelo que consegui observar, em
nenhuma outra profissão, como por exemplo, ao final dos cursos de Direito e
Engenharia.
2.
Sobre tal juramento, fui colecionando
diversas notas, especialmente no campo da Deontologia. Como fui, no ano de
2017, eleito Conselheiro do Conselho Consultivo daFundação de Apoio ao Ensino,
Pesquisa e Assistência (FAEPA) do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, senti-me
encorajado a elaborar este pequeno e modesto estudo.
3.
A tradição de vinte e quatro séculos
de prestação desse juramento por todos aqueles que ingressam na profissão
médica, em todo o mundo, revela a consagração desse compromisso.
Do teor de tal juramento, encontramos pontuais condutas éticas a impor
aos médicos obediência durante o exercício de sua profissão.
o juramento de hipócrates. |
4.
No ano486 a.C, em uma
pequena ilha do Mar Egeu (Grécia) denominada Ilha de Kós, nasceu
e floresceu uma escola médica destinada a mudar a história e os rumos da
Medicina, sob a inspiração daquele que passou a ser, por todo o sempre, o
paradigma de todos os médicos – Hipócrates. É
considerado, até hoje, o Pai da Medicina moderna, pois coube a ele
separar “a Medicina da religião, e da magia, afastou as crenças em causas
sobrenaturais das doenças, e fundou os alicerces da medicina racional e
científica. Ao lado disso, deu um sentido de dignidade à profissão médica,
estabelecendo as normas éticas de conduta que devem nortear a vida do médico,
tanto no exercício profissional, como fora dele”.[2]
5.
Da Escola Médica deHipócrates há uma coleção de 72 livros, coleção
esta conhecida como “Corpus Hippocraticum”
,onde sete livros tratam, exclusivamente da Ética Médica e são eles: Juramento, Da Lei, Da Arte, Da Antiga Medicina, Da Conduta
Honrada, Dos Preceitos, Do Médico.
Sobressai
dentre eles, sem dúvida alguma, o Juramento, que a
tradição de mais de 48 séculos, é prestado e renovado por
todos aqueles considerados aptos a exercer a Medicina e, em regra durante a
cerimônia de colação de grau. No momento em que se dá o Juramento, os acadêmicos passam a ser admitidos
pelos seus pares, como novos integrantes da classe médica. O Juramento de Hipócrates “é considerado um patrimônio da
humanidade por seu elevado sentido moral e, durante séculos, tem sido repetido
como um compromisso solene dos médicos, ao ingressarem na profissão”.[3]
Daí porque, os novos médicos não podem e não devem esquecer a sua
importância, além da necessidade de conhecer e saber o que representa.
o texto do juramento. |
6.
O texto original doJuramento, que chegou até nossos dias, está escrito
em grego clássico. Daí porque, foi traduzido em vários idiomas. Traduções estas
oriundas de antigos e raros documentos, que são mencionados no referido artigo
do professor Joffre M. de Rezende. Entre tais
documentos são citados os seguintes: a) – o manuscrito “Urbinas Graecus” da Biblioteca Apostólica
Vaticana, texto este localizado entre os anos X e XI, sendo interessante
observar que o documento é escrito em forma de cruz, para bem marcar o
patrocíncio religioso; b) – o manuscrito “Marcianus Venetus”,
do século XI, pertencente à Biblioteca de São Marcos em Veneza, considerado
como texto original, uma vez que conserva a invocação dos deuses da mitologia
grega, diante de sua origem pagã; c) – o manuscrito do século XII da Biblioteca
Apostólica Vaticana e inserto em “Vaticanus Graecus 276”;
d) – manuscrito do século XII da Biblioteca de Paris.
Esse
último manuscrito guarda a invocação inicial dos deuses da mitologia grega e
corresponde ao texto mais difundido na atualidade.[4]
7.
O saudoso professorEdmundo Vasconcellos, eminente mestre de Clínica
Cirúrgica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, publicou um
notável artigo na Revista Paulista de Medicina, em
abril de 1974, sobre o Juramento de
Hipócrates, onde esclarece ter se valido da tradução literal do texto,
gentilmente feita pelo professor Alexandre Corrêa, ilustre e cultíssimo
helenista. Esclarece ter cotejado a tradução na publicação bilíngüe de Littré,
publicada em 1844 por Balière, autor dos mais autorizados sobre toda a obra
hipocrática.[5]
Assim está
redigida a tradução feita pelo saudoso professor Alexandre Corrêa:
“ Juro por Apolo, médico, e por Esculápio, por Hygéia, por Panacéia,
e por todos os deuses e deusas, constituindo-os os juízes de como, na medida
das minhas forças e do meu juízo, haverei de fazer executado o seguinte
juramento e o seguinte compromisso: considerarei aquele que me ensinou esta
arte o igual a meus pais; prometerei partilhar com ele os meus bens; e, se
padecer necessidades, torná-lo-ei participante deles; considerarei os seus
filhos meus irmãos, e, se quiserem aprender esta arte, haverei lh’a ensinar sem
qualquer salário nem compromisso. Dos preceitos, das lições ouvidas e todas as
mais instruções farei a transmissão aos meus filhos, aos filhos do meu mestre,
aos discípulos ligados por uma obrigação, tendo jurado, segundo a lei médica;
porém a ninguém mais. Aplicarei os regimes de vida para a utilidade dos doentes
de acordo com a minha capacidade e meu juízo, abstendo-me de qualquer malefício
ou dano (injustiça). Não porei nenhum veneno em mãos de ninguém, mesmo que n’o
peçam, nem tomarei a iniciativa de o aconselhar; igualmente não entregarei a
nenhuma mulher um pessário abortivo. Passarei a minha vida e praticarei a minha
arte pura e santamente. Não operarei de nenhum modo os padecentes de litíase
(não praticarei a litotomia), deixando a prática desse ato aos profissionais.
Em quantas casas entrar, fá-lo-ei só para a utilidade dos doentes, abstendo-me
de todo o mal voluntário e de toda voluntária maleficência e de qualquer outra
ação corruptora, tanto em relação a mulheres quanto a jovens, sejam livres ou
escravos. O que for que veja ou ouça, concernente à vida das pessoas, no
exercício da minha profissão ou fora dela, e que não haja necessidade de ser
revelado, eu calarei, julgando que tais coisas não devem ser divulgadas. Se eu
cumprir fielmente este juramento sem infringir, seja-me dado gozar, feliz, da
minha profissão, honrado por todos os homens, em todos os tempos; mas, se o
violar e perpetuar um prejuízo, que o contrário me suceda”.
8.
O saudoso professorEdmundo Vasconcellos observa que a tradução mais
citada e tida como a mais próxima do original grego está em “Oeuvres completes d’Hipocrate”, edição bilíngue
publicada por E. Littré pela Editora J. B. Balière, em 1844, sendo importante
mencionar, também, as versões em inglês de Francis Adams, de 1849 transcrita na
coleção Harcard Classic, vol. 38 de 1910 e a de W. H. S. Jones,
que se encontra na coleção Loeb Classical Library,
desde 1923.
Merece
ser destacada a tradução em português do texto grego feita por Bernardes de
Oliveira, autor do livro “A evolução da Medicina até
o Século XIX”, tradução esta baseada no texto em inglês feita
por Jones:
“Juro por
Apolo Médico, por Esculápio, por Higéia, por Panacéia e por todos os deuses e
deusas, tomando-os como testemunhas, obedecer, de acordo com meus conhecimentos
e meu critério, este juramento: Considerar meu mestre nesta arte igual aos meus
pais, fazê-lo participar dos meios de subsistência que dispuser, e, quando
necessitado com ele dividir os meus recursos; considerar seus descendentes
iguais aos meus irmãos; ensinar-lhes esta arte se desejarem aprender, sem
honorários nem contratos; transmitir preceitos, instruções orais e todos outros
ensinamentos aos meus filhos, aos filhos do meu mestre e aos discípulos que se
comprometerem e jurarem obedecer a Lei dos Médicos, porém, a mais ninguém.
Aplicar os tratamentos para ajudar os doentes conforme minha habilidade e minha
capacidade, e jamais usá-los para causar dano ou malefício. Não dar veneno a
ninguém, embora solicitado a assim fazer, nem aconselhar tal procedimento. Da
mesma maneira não aplicar pessário em mulher para provocar aborto. Em pureza e
santidade guardar minha vida e minha arte. Não usar da faca nos doentes com
cálculos, mas ceder o lugar aos nisso habilitados. Nas casas em que ingressar
apenas socorrer o doente, resguardando-me de fazer qualquer mal intencional,
especialmente ato sexual com mulher ou homem, escravo ou livre. Não relatar o
que no exercício do meu mister ou fora dele no convívio social eu veja ou ouça
e que não deva ser divulgado, mas considerar tais coisas como segredos
sagrados. Então, se eu mantiver este juramento e não o quebrar, possa desfrutar
honrarias na minha vida e na minha arte, entre todos os homens e por todo o
tempo; porém, se transigir e cair em perjúrio, aconteça-me o contrário”.[6]
Cumpre
observar, como o faz o professor Joffré M. de Rezende,
que, em todos os idiomais, as traduções apresentadas diferem entre si em alguns
aspectos relativos à linguagem empregada, embora mantenham todas o núcleo central dos
preceitos que compõem o juramento.[7] Acrescenta que as diferenças existentes se
encontram principalmemente entre algumas passagens e no significado de
determinadas palavras gregas, que não encontram equivalentes em outros idiomas,
além da polissemia que permite um leque de opções na língua de chegada.
9. O professorJoffre M. de Rezende faz o
trabalho de colocar em análise diversos vocábulos em grego e sua
corresppondência com as traduções feitas em inglês, francês e português. Trata-se
de um interessante estudo sobre o conteúdo do texto do Juramento para aquele que deseja se aprofundar
em seu estudo. [8]
texto da declaração de genebra. |
10.
Em 1948, diante das atrocidades
verificadas durante a Segunda Guerra Mundial, especialmente, nos campos de
concentração nazistas, a Associção Médica Mundial, em sua Assembléia Geral,
aprovou a denominadaDeclração de Genebra, considerada
como um dos documentos cenrtrais da Ética Médica. O texto original da
Declaração foi alterado três vezes (1968, 1983 e 1994) e revisto duas (2005 e
2006). Em 2016, a Associação constituiu um grupo de trabalho com a finalidade
de preparar uma nova versão ao texto da Declaração a ser apresentado ao Comitê
de Ética daquela institução.
11.
ADeclarção de Genebra adotada
pela Associação Médica Mundial, com sua redação aprovada em 1983, tem o
seguinte teor:
“ Prometo solenemente consagrar a minha vida a serviço da Humanidade.
Darei aos meus Mestres o respeito e o reconhecimento que lhes são
devidos.
Exercerei a minha arte com consciência e dignidade.
A Saúde do meu Doente será a minha primeira preocupação.
Mesmo após a morte do doente respeitarei os segredos que me tiver
confiado.
Manterei por todos os meios ao meu alcance, a honra e as nobres
tradições da profissão médica.
Os meus Colegas serão meus irmãos. Não permitirei que considerações de
religião, nacionalidade, raça, partido político, ou posição social se
interponham entreo meu dever e o meu Doente.
Guardarei
respeito absoluto pela Vida Humana desde o seu início,
mesmo sob ameaça e não farei uso dos meus conhecimentos médicos contra as leis
da Humanidade.
Faço estas promessas solenemente, livremente e sob a minha honra.”
12.
Em sua versão de 2017, o texto da
Declaração é o seguinte:
“COMO MEMBRO DA PROFISSÃO MÉDICA:
RESPEITAREI a autonomia e a dignidade do meu doente;
GUARDAREI o máximo respeito pela vida humana;
NÃO PERMITIREI que considerações sobre idade, doença ou
deficiência, crença religiosa, origem étnica, sexo, nacionalidade, filiação
política, raça, orientação sexual, estatuto social ou qualquer outro fator se
interponham entre o meu dever e o meu doente;
RESPEITAREI os segredos que me forem confiados, mesmo após a morte
do doente;
EXERCEREI a minha profissão com consciência e dignidade e de
acordo com as boas práticas médicas;
FOMENTAREI a honra e as nobres tradições da profissão médica;
GUARDAREI respeito e gratidão aos meus mestres, colegas e alunos
pelo que lhes é devido;
PARTILHAREI os meus conhecimentos médicos em benefício dos
doentes e da melhoria dos cuidados de saúde;
CUIDAREI da minha saúde, bem-estar e capacidade para prestar
cuidados da maior qualidade;
NÃO USAREI meus conhecimentos médicos para violar direitos
humanos e liberdades civis, mesmo sob ameaça;
FAÇO ESSAS PROMESSAS solenemente, livremente e sob palavra de
honra”.
Trata-se de texto revisto na 68ª. Assembléia Geral da Associação
Médica Mundial realizada em Chicago, EUA, em outubro de 2017.
tradição do juramento nas escolas de medcina. |
13.
A tradição doJuramento a ser prestado no final dos Cursos
de Medicina teve início na University of Wittenberg, na Alemanha em 1508. Teve seus altos e baixos em
popularidade até a segunda metade do século XX, quando se estabeleceu a sua
tradição na formação médica.
14.
A partir da década de 1950, em
virtude dos inegáveis avanços da Ciência Médica, cresceu o movimento junto aos
médicos e órgãos de classe na busca de atualizar-se o texto doJuramento. Isto é, buscar-se sua modernização, para
mantê-lo relevante. Foi modificado, revisado e também substituído e as
substituições, por sua vez, revisadas, em uma “tentativa de refletir com
precisão as mudanças nas expectativas sobre o comportamento ético dos médicos
em relação com pacientes, em um mundo no qual os primeiros frequentemente não
dão a última palavra”.[9]
15.
Todo juramento exige a presença de“algo” ou de “alguém”. O Juramento de
Hipócrates se inicia com a invocação de
deuses e deusas da mitologia grega (e depois romana), uma vez que foi ditado em
uma era pagã.[10]
O Juramento invoca o “Apolo, médico”, bem como “Asclépio, Higeia e Panacéia”, deuses da mitologia
grega. Apolo era filho de Zeus (rei dos deuses do
Olimpo). Ocupava lugar de destaque entre os deuses. Era conhecido como
deus da luz e do Sol, da verdade e da profecia, da medicina e da cura, das artes, da poesia e da música, entre
outras coisas, que congregava em si. Pode-se dizer que Apolo era um deus de
grande importância para a mitologia grega. Ademais, a medicina e a cura
associadas a Apolo estavam presentes pela mediação de seu filho, Acléspios, mais tarde chamado de Esculápio pelos romanos. Enquanto Apolo possuía
vários domínios de atuação, Esculápio era
deus, especificamente, da medicina e
da cura, na antiga mitologia grega.[11] Interessante observar que Esculápio teve por mãe Coronis, que foi morta
ainda grávida de Asclépios, por ter sido infiel a Apolo, mas seu filho foi
resgatado vivo de seu útero. Por isso recebeu o nome Asclépios, que signifca
algo como “abrir com um corte”. Os romanos
traduziram Asclépios para Esculápio (Aesculapius). As palavras “escalpelo” (sinônimo de bisturi) e “scalpel” (bisturi em inglês) não são mera coincidência.
Esculápio era o deus específico da medicina,
da cura, do rejuvenecimento. Os ancestrais da nossa
civilização ocidental, quando doentes, peregrinavam em massa para os templos de
cura dedicados a Esculápio (Asclépios), que era simbolizado por um bastão
envolvido por uma serpente. Em homenagem a Asclépios, durante os rituais de
cura, várias cobras não venenosas eram deixadas serpenteando no chão dos
quartos ocupados por doentes e feridos.[12] Higeia, na mitologia
grega, é filha de Asclépios. Se, de um lado, Asclépios era associado à recuperação e cura, a figura de
Higéia (Ὑγεία) era associada à prevenção das doenças e à continuidade da boa saúde. Ela era
a deusa da saúde, da limpeza e
do saneamento. Seu nome deu origem à palavra higiene. Panacéia é irmã
de Higeia, portanto filha de Asclépio e neta de Apolo. Panaceia é deusa
da cura. Observa-se que Apolo também era deus da cura,
entre outras coisas. Acontece que Panaceia e suas 4 irmãs, possuíam cada uma,
faceta específica da arte de Apolo: Panacéia, a cura;
Higeia, a prevenção; Meditrina, a longevidade; Algeia (também conhecida como “Egle”),
a beleza natural; e Akeso (ou Aceso), a recuperação. Panaceia detinha uma poção, com a qual
curava os doentes. Daí surgiu o termo panaceia, utilizado
até hoje para descrever um medicamento capaz de curar muitas doenças, ou “remédio universal” capaz de solucionar todos os
males.[13]
Quando se
faz um Juramento, jura-se sempre por alguma coisa,
que representa algo de caráter sagrado, como também se pode ter em conta um
ancestral (vivo ou morto). São comuns os juramentos: “Juro pela minha mãe…”, “juro pela alma de minha mãe” e “juro por Deus”. Ao invocar deuses da mitologia grega,
o Juramento de Hipócrates nos reporta a nossos ancestrais de tempos imemoriais,
do berço da civilização ocidental, “a quem devemos não apenas
nossa herança genética e de conhecimento”. Naquele remotíssimo
tempo, foram criados esses personagens mitológicos (deuses, portanto sagrados).
Esses personagens “sempre foram simbólicos e representavam uma série de fenômenos até hoje inexplicáveis pela
lógica”.[14]
Daí porque, ouso discordar com todo o respeito possível ao grande médico
Dráuzio Varella, quando afirma soar o ridículo quando se vêm acadêmicos jurar
por Apolo, Asclápios, Higeia e Panaceia em artigo que publicou sob o título
“Juramento de Hipócrates,
de uma importante reflexão. |
16.
Já agora, depois dessas
considerações, surge uma indagação pertinente que nos leva à reflexão:além do Juramento de Hipócrates, quais são os outros
juramentos que os médicos têm feito nas últimas décadas?
O site Medscape dedicado a assuntos médicos, e que
serve de referância para os profissionais da Medicina, dá conta de uma pesquisa
feita com estudantes e médicos em exercício, onde se questinou sobre o
Juramento de Hipócrates e sobre a questão de ser relevante ou não para a
prática médica, ou se deveria ser revisado para expressar as preocupações
éticas contemporâneas. A pesquisa foi feita on line e reuniu mais de 2.600 respostas de
médicos e mais de 200 comentários, muitos deles extensos.
17.
O resultado obtido foi o seguinte:
18.
a) – Mais da metade (56%) dos médicos
entrevistados fizeram o Juramento hipocrático.
19.
b) – Três (3) por cento declararam
ter feito o juramento de Maimônides, um juramento tradicional para médicos
atribuído a Maimônides, um médico e filósofo medieval, usado como alternativa
ao juramento de Hipócrates.
20.
c) – Seis (6) por cento recitaram a
Declaração de Genebra de 1948, onde são estabelecidas diretrizes éticas para os
médicos após a Segunda Guerra Mundial, por conta das atrocidades cometidas
pelos médicos nazistas e reveladas nos julgamentos de Nuremberg.
21.
d) – Cinco (5) por cento preferiram a
versão modificada do juramento de Hioócrates escrito em 1964 pelo Dr. Louis
Lasagna, reitor acadêmico daTufts University School of
Medicine.
22.
e) – Nove (9) por cento prestaram um
juramento alternativo escrito pelos professores de suas próprias Faculdades de
Medicina; um (1) por cento recitaram um juramento escrito por suas próprias
turmas e 14 (quatorze) por cento não fizeram juramento médico algum.[15]
23.
Quanto àsidades dos entrevistados, apurou-se o
seguinte: três quartos dos participantes (75%) tinham 45 anos de idade ou mais,
12% tinham de 35 a 44 anos e 9% menos de 34 anos.
24.
Quanto às indicações de como a
prestação do juramento sofreu modificações nos últimos anos, tais indicações
foram fornecidas por uma pesquisa realizada em 2009, com 98 reitores de
Faculdades de Medicina dos Estados Unidos da América e do Canadá, que relataram
a forma dos juramentos usados em suas instituições.[16]Descobriu-se que o uso do juramento hipocrático
estaria em declínio. Em 33,3% das Faculdades os estudantes faziam o juramento
do Dr. Lasagna. O segundo juramento mais utilizado era a Declaração de Genebra
(15,6%). Empatados em terceiro, com 11,1%, estavam o tradicional Juramento de
Hipocrátes e “outro” que incluía juramentos
escritos por um professor da Faculdade, pelos alunos, ou pelos dois em
conjunto.[17]
25.
A pesquisa doMedscape aponta que para a maioria dos médicos
(81%) o tradicional juramento hipocrático é “muito” ou “um tanto significativo” para a prática da
Medicina. Em suma, “o juramento é a constituição
da profissão médica”. Todavia, para 7% dos participantes da pesquisa
o juramento seria “ligeiramente significativo” e
para 11% “nada significativo”.[18]
26. Quanto ao texto do juramento hipocrático, para 62% dos participantes –
maioria – deveria permanecer em sua forma tradicional e ser mantido como está.
Mais de um terço (28%) entendeu que o juramento deveria ser revisado e
substituído, enquanto 9% opinaram que deveria ser abandonado.[19]
textos abreviados ou resumidos. |
22.
Textosabreviados ou resumidos têm sido
utilizados nas Faculdades de Medicina de diferentes países a começar em França
que se utiliza de um modelo abreviado conhecido como juramento de Montpelier.
Posteriormente, se passou ao uso de um texto mais resumido, onde foi incluído
um novo compromisso, qual seja o de atender gratuitamente os pobres e o de ser
moderado na cobrança de honorários e deixando de mencionar outros preceitos
contidos no texto original do juramento, entendendo estejam submetidas nas
expressões genéricas de “ser fiel às leis da honra e da
probidade no exercício da medicina” e de “não corromper os costumes, nem favorecer o crime”.[20] Na língua
inglesa existem várias formas abreviadas do Juramento “que não seguem exatamente o modelo francês”, tendo
como exemplo o texto utilizado no New York Medical College.[21]
No Brasil, a maioria das Faculdades de Medicina utiliza um modelo
simplificado que, segundo o saudoso professor Edmundo Vasconvellos, chegou a
ser usado na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e cujo texto é
o seguinte:
“ Prometo
que ao exercer a arte de curar, mostrar-me-ei sempre fiel aos preceitos da
honestidade, da caridade e da ciência.
De lembrar-se que uma variante desse texto tem livre curso em nossas
Faculdades de Medicina.
No entanto, difere do texto antes transcrito em um pequeno detalhe de
redação que modifica inteiramente o sentido da frase. Eis o texto:
Nota-se,
comparando-se as duas versões, que a diferença consiste na substituição, no
segundo parágrafo, da locução pronominal o que pela
locução os quais. Na primeira versão a
locução o que se refere ao
enunciado na frase anterior, ou seja, expressa a intenção do médico de guardar
sigilo em relação aos “segredos que me forem
revelados”. Na segunda versão, a locução pronominal os quais, no plural, tem como antecedente “os segredos que me forem revelados”. À evidência, não
faz o menor sentido fazer-se “dos segredos que me forem
revelados” um “preceito de honra”.[24]
23.
No consubstancioso artigo mencionadono
decorrer deste pequeno estudo, o professor. Joffre M. de Rezende realliza
uma detida e exaustiva pesquisa sobre como se apresenta o Juramento de
Hipócrates nas diversas Faculdades de Medicina brasileiras na solenidade de
formatura do curso médico.
Para tanto, foram enviadas cartas-circulares, em nome da Sociedade
Brasileira de História da Medicina, a 82 Faculdades, obtendo-se respostas de 41
e três delas não especificaram o texto em uso. Daí porque na análise foram
incluídas somente 38 Faculdades.
O resultado da pesquisa aponta que das 38 Faculdades, apenas três (3)
usam o texto do Juramento por extenso e a maioria se utiliza de um modelo
simplificado de uso corrente e traz o seguinte: a) – três Faculdades se
utilizam do texto por extenso (07.9%); b) – duas usam o texto por extenso
modificado (05.3%); c) – três se urtilizam de textos próprios (07.9%); d) –
vinte e três usam texto simplificado (60.5%); e) – seis usam mais de um texto
(15.8%); f) – uma se utuiliza da Declaração de Genebra (02.6%).
Das seis Faculdades,que utulizam mais
de um texto, cinco empregam a forma simplificada, que é assim adotada em 28
Fculdades (73.7%) e destas, apenas nove (32.1%) usam a redação correta com a
locução pronominal o que, enquanto
18 (64.3%) empregam a locução pronominal incorreta os quais e uma aos quais.[25]
atualização do juramento, |
24.
A partir do século XX, especialmente,
o “progresso científico e o avanço tecnológico da medicina, aliados à
evolução do pensamento e dos costumes, trouxeram novos conceitos e novos
aspectos relativos à ética médica e a validade do juramento de Hipócrates
passou a ser questionada, se não em seu significado simbólico, pelo menos em
seu conteúdo”,Daí o surgimento de numerosas propostas no sentido
de “atualizar” ou “modernizar” o
seu texto.[26]
As
alterações sugeridas visam, principalmente, compatibilizá-lo “com a Bioética e adaptá-lo à problemática decorrente da prática
médica atual, com o objetivo de evitar a conivência dos médicos com as falhas
dos atuais sistemas de saúde, sempre que houver prejuízo para os doentes e com
os interesses financeiros da indústria farmacêutica e de equipamentos médicos,
que procuram influenciar a conduta do médico”.[27] São inúmeras as propostas de modificações.
Muito embora, procurem contemplar a autonomia do paciente, justiça social e
mercantilização da medicina, “afrouxam as obrigações dos
discípulos para com seus mestres” substituem a proibição
do aborto por sua regulamentação, “e suprimem o item referente à
operação de calculose vesical”.[28]
O
professor Joffre M. de Rezende toma o cuidado de
listar as propostas oriundas de entidades de maior representatividade, quais
sejam: 1) – Declaração de Genebra da Associação Médica Munidial (1948), a mais
antiga e conhecida de todas e que é utiizada em diversos países, quando da
recepção aos novos profissionais inscritos no respectivo Conselho; 2) – texto
de Brighton (1995) elaborado por 35 eticistas, médicos e não médicos reunidos
naquela cidade; 3) – texto do Código de Deontologia Médica da França aprovado
pelo Decreto n. 95-1000, de 6.9.1995, art. 109; 4) – o texto proposto pela
British Medical Association em 1997 e que dá ênfase à autonomia do paciente,
admite o aborto, desde que permitido em lei, e inclui o consentimento
esclarecido do paciente para a sua participação em qualquer investigação
científica; 5) – Carta do Profissionalismo Médico de 2002. Trata-se de documento
que não se destina a substituir o juramento de Hipócrates, pois é, antes de tudo,
um verdadeiro código de contuta do médico. Foi elaborado em conjunto por
diversas instituições médicas norte-americanas, ao lado da Federação Médica
Européia de Medicina Interna.[29]
25.
Em 1984 foi feita uma pesquisa na
classe médica braileira, por amostragem, sobre se o juramento de Hipócrates
deveria ou não ser modificado e o resultado foi o seguinte[30]:
Deve
permanecer inalterado: 80%
Deve
ser modificado: 15%
Deve
ser ignorado: 5%
Apesar do tempo decorrido, pode servir de indicativo para a pesquisa
feita no decorrer deste pequeno estudo.
26.
Como anota o professorJoffre M. de Rezende a pergunta que se impõe é a
seguinte: deve o juramento de Hipócrates ser modificado
ou substituído por outro documento?
A resposta a esta pergunta, nos obriga a tecer algumas considerações.
O
juramento existe a 2.600 anos. Foi recepcionado e incorporado à memória
histórica da civilização ocidental. Daí a necessidade de se dar ênfase ao
cultivo de nossa cultura, sob pena de que ocorra a destruição da “cultura da vida e o legado da medicina hipcrática e cristã, e a
sociedade é quem pagará o preço.[31]
Em nota de
rodapé deixamos expresso em resumo, um justo desabafo sobre a profissão médica.
Sua leitura é fundamental, diante das constantes investidas feitas contra a
classe médica.[32]
Num
editorial publicado no The Medical Journal of
Australia, o professor Edmund Pellegrino escreveu:
“Talvez para muitos o juramento médico hoje seja apenas um
fragmento de uma antiga imagem despedaçada. Mas o suficiente dessa imagem
permanece na consciência dos profissionais para lembrá-los de que
desconsiderá-la completamente seria como transformar a medicina num
empreendimento comercial, industrial ou proletário.”
27.
No decorrer deste estudo é realçada a
importância do Juramento de Hipócrates, ponto fundamental para uma das mais
nobres profissões, qual seja a Medicina. Os médicos lidam com o bem maior e
fundamental da Humanidade, qual seja avida. Na relação
médico e paciente se encontra a certeza da presença de alguém (paciente) a
sofrer a perda de sua saúde e que encontra no médico a recompensa e a esperança
de recuperá-la. A vida humana sempre estará presente.
Daí a imortância e a relevância dos princípios éticos que o juramento
encerra. Princípios éticos da Medicina que são eternos e mesmo com o
incontestável avanço da ciência médica são regras a conduzir os médicos no
exercício de sua nobre e insubestituível profissão, para o bem de toda a
Humanidade.
ética e moral. A conduta humana. |
28.
Tanto a norma moral, como a norma
jurídica, estabelecemrumos de conduta, a guiar os
homens, pois no dizer de Horkounov, em nossa
atividade consciente, obedecemos “às regras que nos apontam
a linha de conduta a ser adotada para a
consecução deste ou daquele determinado fim.” [33]
Tais normas possuem, assim, força de obrigatoriedade, embora as
respectivas sanções sejam de natureza diversa[34], tendo ambas um fundamento ético comum, pois,
conforme o magistério de Radbruch: “Não há, pode dizer-se, um único domínio da conduta humana, quer
interior, quer exterior, que não seja susceptível de ser ao mesmo tempo objeto
de apreciações morais e jurídicas.” [35]
29.
Neste ponto, surge a pergunta:Ética é o mesmo que Moral? Para muitos estudiosos
não há diferença, pois ambas possuem idêntica origem etimológica. Moral deriva
da palavra latina “mores”, enquanto ética vem de um
vocábulo grego e ambos significam “costumes”. No
entanto, para alguns filósofos, como Kant, há diferença
entre elas. Enquanto a moral “designa o conjunto dos princípios gerais”, a “ética” corresponde à “sua aplicação concreta”.[36] Para alguns outros, a ética tal como a
entendem “é o estudo lógico da linguagem da moral”.
José
Renato Nalini, em seus estudos e livros notáveis e
brilhantes, diz que a “Ética é a ciência do
comportamento moral dos homens em sociedade”. É uma ciência porque
possui objeto próprio, leis próprias e método próprio. O objeto da Ética é a
Moral que é um dos aspectos do comportamento humano.[37]
Para
alguns estudiosos, em uma visão pragmática, a “moral é ampla e abundante.
Quando suas normas são positivadas, está-se a falar de Ética.
Por isso é que existem “Códigos de Érica” e não “Códigos de Moral”.[38]
Por fim, cabe observar que a Ética é
uma disciplina normativa, “não por criar normas, mas por descobri-las e
elucidá-las”. Seu conteúdo mostra às pessoas “os valores e princípios que devem nortear sua existência. A Ética
aprimora e desenvolve o sentido moral do comportamento e influencia a conduta
humana”.[39] Ademais, a
Ética é a doutrina “do valor do
bem e da conduta humana que tem por objetivo realizar esse valor”, a
Ética “não é senão uma das formas de atualização ou
de experiência de valores ou, por outras palavras, um dos
aspectos da Axiologia ou Teoria dos Valores”. Assim, “o complexo de normas éticas se alicerça em valores”,
normalmente, designados “valores do bem”.
Daí porque não se pode deixar de entender que há “conexão indissolúvel entre o dever e o valioso”.[40]
deontologia. |
30.
Quando em uma determinada profissão,
por seus órgãos diretivos ou de classe, se procura anormatização de seus deveres,
através de uma deontologia específica,
estamos diante de regras a impor dever de conduta àqueles que fazem parte da
referida profissão.
No
campo da Deontologia (“deon” + “logus” = ciência dos deveres) vamos encontrar regras, especialmente,
de “direito disciplinar que “instrumentalmente se ligam a normas
éticas e normas de Direito comum”.[41]
Daí
porque, Léon Husson, conforme citado pelo saudoso
professor Miguel Reale, analisando “as atividades profissionais e o Direito”, afirma que o
termo “Deontologia” “présente l’avantage de
désigner, sans spécifier s’ils présentent un caractère juridique ou un
caractère moral, lénsemble des devoirs qui s’imposent “in concreto” dans une
situation sociale définie” [42].
Rafael
Bielsa, o notável publicista portenho,
ensina: “Si bien todo profesional ejerce su profesión con miras a la
eficacia que lo acredita, un motivo de interés comun a todos los
profesionales que es la dignidad de la profesión,
la legitima confianza que debe inspirar, les impone deberes
determinados, que constituyen, precisamente, la deontologia; essos deberes
son también morales” [43].
A defesa dos princípios e regras de conduta fixados na
Deontologia de uma determinada profissão, cuja razão está na presença da honra
profissional, normalmente, “se justifica por una especie
de autodefensa colegiada…” [44]
Portanto,
a desobediência “ao comando de ordem moral
pode, por si só, dar causa a uma penalidade de natureza disciplinar, tal a
importância que se confere à correta conduta profissional.” [45]
31.
Já agora, passamos a fazer breves
considerações sobre aresponsabilidade civil dos
médicos, no exercício de sua nobre profissão.
Sempre se
entendeu, e ainda hoje se entende, que a
responsabilidade civil do médico, bem como de outros profissionais liberais, é
de natureza subjetiva.
O Código Civil de1916 dispunha em seu art. 1545:
“Os médicos … são obrigados a satisfazer o dano,
sempre que da imprudência, negligência ou imperícia,
em atos profissionais, resultar morte, inabilitação de servir, ou ferimento”.
Em identidade normativa dispõe o art. 951 do vigente Código Civil:
“ O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de
indenização devida por aquele que,
no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte,
agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho”.
Bem por
isso continua atual a lição de Clóvis, o maior de
nossos civilistas, em comentário ao art. 1545 do Código Civil de 1916:“ A responsabilidade das pessoas indicadas neste
artigo, por atos profissionais, que produzam morte, inabilitação
para o trabalho, ou ferimento, funda-se na culpa” [46].
Logo, uma
relação desse jaez não pode, assim, submeter-se à dicção do art. 14, caput, do Código de Defesa do
Consumidor, que trata da responsabilidade de requerer “defeitos relativos à prestação de serviços”.
Assim,
mesmo com tantas novidades para a proteção do consumidor, porém, a Lei 8.078,
de 11 de setembro de 1990, em seu art. 14, § 4º, foi
taxativa para repetir a fórmula consagrada
da responsabilidade subjetiva dos profissionais dessa
natureza, ao estipular textualmente: “A responsabilidade pessoal
dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”.
Em
obra específica sobre a matéria, conferem o professor Arruda Alvim e Outros colaboradores a exata dimensão que se há de dar ao mencionado
dispositivo da nova lei: “O parágrafo quarto, último
deste artigo, afasta dos profissionais liberais a responsabilidade
independentemente de culpa pelo fato do serviço. Assim, a
responsabilidade civil pelos danos decorrentes do serviço dos
profissionais liberais, como médicos, advogados, odontólogos, contadores e
outros, dependerá da existência e comprovação da culpa”.[47]
32.
Na atividade médica, o profissional
da Medicina lida com orisco que decorre da doença, da patologia apresentada pelo
paciente. Não se trata, assim, de risco da atividade médica.
A doença,
moléstia ou patologia, atua duas vezes, pelo menos, como fator de risco: (1) – agride
o organismo do paciente, coloca em risco a sua saúde; (2) – obriga o médico a
intervir, a realizar cirurgia, por exemplo, que é uma intervenção em situação de risco criado pela moléstia e não se trata, assim, de risco criado pela atividade médica.
Em suma,
quando o médico é chamado a intervir, já existe uma situação de risco criada pela
patologia de que o paciente é portador.
Logo,
mesmo agindo da forma mais diligente possível,
pode não obter êxito no tratamento.
Se
essa não fosse a realidade, ninguém morreria de
enfermidades – todas as doenças seriam curadas, mediante a intervenção médica.
Não se
pode olvidar, assim, que o paciente, em virtude da moléstia de que é portador,
se encontra em situação de risco em sua
saúde e, diante desta circunstância, o médico é chamado a intervir.
Em v.
acórdão do egrégio Tribunal de Justiça de São
Paulo, encontramos imorredoura lição ministrada pelo eminente e
notável Desembargador Laerte Nordi: “Porque os médicos são seres humanos e sujeitos à falibilidade
inerente à árdua profissão, tenho afirmado que somente prova cabal de
erro flagrante e indesculpável pode levar à responsabilização,
sobretudo em face do elevado número de pessoas atendidas e operadas por dia. E
se eles cuidam do mais difícil e complexo dos
mecanismos – o corpo humano – que, às vezes, sugerem várias
alternativas, não se pode nem se deve exigir deles a infalibilidade dos
deuses”.[48]
Quando se
põe a realizar um ato de seu ofício, o médico não se investe tecnicamente da obrigação de cura, da obrigação de resultado, mas assume o encargo
de tratar o doente com zelo e diligência
adequados, de acordo com as aquisições da ciência, ou, em outras palavras,
passa a ter uma obrigação de fornecimento de
meios.[49] Em
significativo acórdão do Tribunal de Justiça de São
Paulo, após o reconhecimento de que “a vida e
a saúde humanas são ditadas por conceitos não exatos”, também se
assentou que, em tais casos, “cabe ao médico tratar o doente
com zelo e diligência, com todos os recursos de sua profissão para curar o mal,
mas sem se obrigar a fazê-lo, de tal modo que o resultado final não pode
ser cobrado, ou exigido”; e se
finalizou o raciocínio com a assertiva de que a responsabilidade civil do médico está a
representar uma obrigação de meio e não de resultado”.[50]
Em outro
sugestivo acórdão, a egrégia Corte de Justiça assentou que, mesmo após a vigência do Código de Defesa do Consumidor,
não interessando se proposta a ação contra o hospital ou contra o médico
pessoalmente, não se aplica a responsabilização objetiva,
porquanto o que se põe em exame é o próprio trabalho médico, devendo-se
submeter a questão aos estritos lindes do § 4º do art. 14 do referido
Código [51].
Como se vê, a responsabilização do
profissional da área médica, na atualidade, reveste-se de natureza subjetiva,
no que o ordenamento segue a tradição de nosso Direito para a responsabilidade
indenizatória genericamente considerada, estando, assim, afastada a hipótese de
aplicação dos princípios norteadores da responsabilidade objetiva.
princípios éticos do juramento. |
33.
O Juramento encerra diversos
princípios e regras éticas. Vamos a eles.
34.
Da leitura do juramento e em análise
de seus preceitos, surge como princípio primeiro da ética médica, apreservação da vida humana, estando o médico dedicado
a manter a saúde de seu paciente. E a preservação da vida humana haverá de
existir desde seu início com a concepção.
Inclsusive o Juramento fala de que nunca será administrada uma substância abortiva às mulheres.
De sua
parte, não é ocioso recordar que a “Declarção de Genebra” quando
de sua aprovação pela Associação Médica Mundial em 1948, contem o
seguinte: “Guardarei respeito absoluto pela Vida Humana
desde o seu início, mesmo sob ameaça e não farei uso dos meus conhecimentos
médicos contra as leis da Humanidade.
A vida humana e a sua consequente preservação são fundamentais para que a sociedade exista. Daí porque, todos os direitos e deveres contemplados
pela ordem jurídica e social têm raízes no direito fundamental à vida.
35.
Aliás, ao fazer-se o jurmento pelapreservação da vida a partir da concepção, o jovem médico estará a
consagrar a ciência. Com efeito, a ciência – e não
a religião ou a filosofia – comprova que
a vida humana tem início na concepção, quando o espermatozóide penetra o óvulo.
Instala-se a gravidez, que se
encerra com o parto. Desde esse momento, há vida humana a ser preservada.
Ademais,
avançados estudos médicos e científicos demonstram que o nascituro não é apenas uma porção do corpo da gestante, mas um ser autônomo
com vida própria, apenas “transitoriamente ligado, pelas
deficiências de uma fase de sua evolução, ao organismo materno”. Bem
por isto, quaisquer constrangimentos, físicos ou psíquicos, suportados pela mãe
interferem de alguma maneira em seu natural desenvolvimento. Nesta parte,
cumpre recordar que o Código Penal alemão “considera o aborto como
um delito de homicídio e o feto como um ser vivente
autônomo, embora dependente do organismo materno até o parto”,
conforme esclarece Mezger.[52]
Por fim, a
décima terceira semana completa o primeiro trimestre da gestação,
quando o coração, fígado, baço e muitos outros órgãos estão a funcionar.
Com total
propriedade, merece ser destacado o seguinte depoimento colhido no Medscape de 21 de fevereiro de 2017, depoimento este
prestado por um médico pediatra: “Enquanto os médicos
continuarem a matar bebês que ainda não nasceram e a ajudar pacientes vivos a
se matarem, como é permitido pelas leis contemporâneas e pela própria
profissão, então o antigo juramento de Hipócrates é irrelevante“.
36.
Durante algum tempo, medrou o
entendimento de que a vida teria seu início, com a formação dosistema nervoso do feto, procurando refutar
que o início da vida ocorre com a concepção.
No “Portal da Família” no “Youtube” é encontrado um vídeo que responde à seguinte pergunta: “A vida humana começa com a formação do
sistema nervoso?”
Referida
teoria defende “que a vida humana começa apenas depois da
formação do sistema nervoso” e usa como “critério o fato da medicina considerar a morte cerebral como o
fim da vida” e utiliza esta “informação para traçar um
paralelo supostamente lógico de que se a vida termina com a morte cerebral,
então ela só começa com a formação do sistema nervoso, antes disso não haveria
vida humana”.
A
igualdade de critérios “neste ponto é enganosa,
utilitarista e reducionista, sendo bastante inadequada e até certo ponto
desonesta”.
Quando se
procura entender-se porque a medicina e o Estado consideram a morte encefálica
como critério para o fim da vida, “entenderemos que o mesmo
critério favorece a defesa do embrião emquanto ser humano vivo e
independente”.
A
morte encefálica “é um bom critério clínico porque
com ela o indivíduo não mais consegue se sustentar de forma autônoma, pois a
partir de uma etapa do desenvolvimento do organismo quem
garante essa autonomia é justamente o sistema nervoso”. Um organismo
adulto sem o funcionamento do sistema nervoso (tronco encefálico) perde
irreversivelmente “sua autonomia funcional e a manutenção da
vida torna-se impossível.” Há morte “porque a
situação é irremediável, independente do que for feito dali para frente, todo o
resto do orgamismo irá parar de funcionar”.
No
caso do embrião “ainda sem sistema nervoso formado este
critério não é válido porque mesmo sem o sisterma
nervoso, o embrião consegue sustentar, como
qualquer ser humano em condição favorável, seu organismo de forma autônoma e desenvolver-se perfeitamente
com os recursos orgânicos que possui para atender as demandas
biológicas da respectiva etapa de vida em que está”.
Portanto, “o critério adotado para determinar a morte encefálica não é
a presença ou a ausência de um órgão ou
sistema, isso seria reduzir a vida a um simples órgão, mas sim a capacidade de
aquele organismo se suestentar de forma independente e organizar suas funções
de forma integrada”. Isso o “embrião faz desde sua
concepção, por isso é mais lógico, é mais cientificamente correto e
mais seguro defender o início da vida humana a partir
da concepção”.
A dignidade
da vida humana é um valor em si e não admite relativização.
do aborto. |
37.
O Código Penal brasilerio pune oaborto, como crime contra a vida e contra a pessoa (art. 124). Prevê, também,
duas hipóteses em que não haverá aplicação de pena,
quais sejam as hipóteses de aborto necessário (inciso
I do art. 128) e o aborto sentimental (inciso
II). Em ambas as hipóteses o Código exige a sua prática por médico.
Na
hipótese do inciso I, por exemplo, conforme adverte o eminente professor Aníbal Bruno, “é preciso que haja perigo real
da morte da gestante, perigo que não possa ser afastado de outro modo, para que
se autorize a interrupção da gravidez”, sendo necessário,
ainda, “que todas as possibilidades para a salvação da mãe e
do filho se tenham esgotado”.[53]
Quanto ao
aborto definido no inciso II – gestação proveniente de estupro – conforme
pondera, com toda razão o professor Aníbal Bruno, por
mais respeitáveis que sejam os sentimentos em favor da gestante vítima da
violência, “tomar a situação como justificativa da morte do ser que se gerou é
uma conclusão de fundo demasiadamente individualista, que contrasta com a idéia
do Direito e a decidida proteção que ele concede à vida do homem e aos
interesses humanos e sociais que se relacionam com ela e demasiadamente
importantes para serem sacrificados a razões de ordem pessoal, que, por mais
legítimas que possam parecer não têm mérito bastante para se contrapor ao
motivo de preservação da vida de um ser humano”, vindo a citar a
lição de Alatavilla de que “não há fundamento para falar-se
nesse caso em estado de necessidade e deve-se considerar o aborto, na hipótese,
extremamente cruel” e “a lei protege sempre uma vida
humana, seja embora em estado embrionário, qualquer que seja sua
origem”,[54]
Todas as
demais hipóteses de aborto: indicação eugênica, indicação social, indicação
individual e, muito menos, indicação racista não foram
acolhidas por nosso Código Penal.
De sua
parte, o Código de Ética Médica, de há muito, veda ao médico “descumprir legislação
específica nos casos de transplantes
de órgãos ou tecidos, esterilização, fecundação artificial e abortamento”. Quer dizer: pelo Código de Deontologia Médica, fora
das hipóteses delineadas no art. 128, I e II, do Código Penal, o médico não pode atuar.
No Direito
brasileiro inexiste qualquer hipótese
de aborto legítimo. O art. 128 do Código Penal, nas
duas hipóteses nele defiidas “não declara excluída a
possibiliidadedo ilícito penal”, pois apenas “suprime a pena”,
mas “fica o crime”. Para se colocar uma pá de
cal na discussão doutrinária existente, na interpretação do art. 128, do Código
Penal, especialmente daqueles que enxergam neste dispositivo caso de exclusão
da criminalidade, de recordar-se que a norma constitucional, de hierarquia
suprema, garante a inviolabilidade dos
direitos concernentes à vida. Logo, não
poderia a lei ordinária dispor de
modo diverso. De outra parte, o Direito Civil garante
os direitos do nascituro, ofertando a este a
qualificação de sujeito de direitos e, conseqüentemente, de pessoa, fundada em uma personalidade material. Antes de
todos os direitos, o nascituro tem direito à sua vida e
tal fato se apresenta claro quando o Código Penal inclui o delito de aborto
entre os crimes contra a vida e contra a pessoa. Assim,
mesmo que o aborto sem pena do Código Penal, não fosse crime, “não podemos ter a menor dúvida de que é contra o direito; de que
é um ilícito”.[55]
38.
Cumpre anotar, por derradeiro que em
22 de novembro de 1969 foi subscrita a“Convenção Americana sobre
Direitos Humanos”, conhecida como “Pacto de São José da Costa
Rica”. O Brasil veio a ratificá-la em 25/9/92, após sua
aprovação pelo Congresso Nacional, mediante o Decreto Legislativo 27, de
26/5/92 e o Governo brasileiro, pelo Decreto 678, de 6/11/92
determinou a sua aplicação no Direito interno, sem reserva alguma.
Trata-se
de um tratado multilateral americano, que tem por objeto a reafirmação dos
direitos humanos, a prescrição de garantias do seu exercício e proteção para
que não sejam violados. No tema concernente aos direitos humanos, o art. 1º, 2
do “Pacto de São José” preceitua: “Para efeitos dessa Convenção, pessoa é todo ser humano”.
A expressão “pessoa é todo ser humano” nos
leva, necessariamente, a concluir pela proteção do direito à vida, desde a concepção. Com
efeito, ser humano não é apenas o nascido, mas o nascente, pois vida
há no novo ser concebido.
Para o eminente jurista José Afonso da Silva, “no momento em que o óvulo é
fecundado existe vida humana e se existem vida e pessoa – em
potencial – deve ser protegida contra tudo e contra todos, inclusive a mãe. A
“árvore” será “árvore” se, antes, for semente. Sem semente não haverá árvore”…
Logo, “destruída a semente, não permitindo o processo, “destrói-se a
árvore”. Aliás, o professor Lejane, autoridade
mundial em biologia genética, dirigiu à Comissão Especial do Congresso dos
Estados Unidos da América, no ano de 1981, a seguinte observação: “A vida poderá ter uma história longa; entretanto, cada
indivíduo tem um início bem determinado: o momento da concepção”.
regras éticas no juramento de hipócrates. |
39.
A partir do inconteste e fundamental
princípio concernente à defesa davida, o
Juramento de Hipócrates descreve e realça importantes regras éticas, no exercício da nobre profissão da
Medicina. Regras estas que permanecem atuais e encontram paralelo no Cógido de Ética Médica,
como será possível verificar.
40.
No Juramento consta a regra de seaplicar os tratamentos, regimes a “bem do doente, segundo o meu poder e
entendimento, nunca para causar dano ou maefício a
alguém”. Por esta regra, o médico, janais, poderá causar mal aos seus pacientes. O dr. Alexandre Feldman lembra a existência de efeitos colaterais que os medicamentos poderão
causar. No entanto, é perfeitamente aceitável que os médicos prescrevam drogas
ao seu paciente, a despeito dos possíveis efeitos colaterais, uma vez que o
emprego de tais drogas não provocarão, necessariamente, efeitos colaterais
indesejáveis.
A regra
moral hippocrática encontra correspondência no Capítuto III do Código de Ética Médica, onde se encontra preceito
referennte à Responabildade Profissional, que veda ao médico causar dano ao paciente, por ação ou omissão,
caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência.
O
professor Carlindo Machado Filho em
artigo publicado na “Residência RP Pediátrica”,
órgão oficial da Sociedade Brasileira de Pediatria publicou interessante artigo
sob o título “O Juramento de Hispócrates e o Código de
Ética Médica”, artigo este que será aproveitado para expor sobre
outras regras éticas advindas do referido juramento.
41.
Outra regra moral preconizada por
Hipócrates diz respeito à proibição do médico ministrarremédio mortal ou que induza à perda.
Encontramos correspondência no Capítulo V – Realação com Pacientes e Familiares
– que em seu art. 41 prescreve: “É vedado ao médico abreviar a
vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal.
Parágrafo único. Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico
oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações
disgnósticas ou terpêuticas inúteis e obstinadas, levando sempre em
consideração a vontade expressa do paciente ou na sua impossibilidade a de seu
representante legal”.
42.
Na sequência, o Juramento afirma:“não darei a nenhuma mulher uma substância abortiva”.
Em outro tópico deste estudo foi tratada a correspondência deste
preceito hipocrático com os arts. 14 e 15 do Código de Ética Médica.
43.
Para o Juramento se faz necessário ao
médico conservar com pureza a“sua vida e sua arte”. Há correspondência com o disposto
no Capítulo I – Princípios Fundamenntais -, onde consta o seguinte
preceito: “ao médico cabe zelar e trabalhar pelo
perfeito desempenho ético da Medicina, e bom conceito da profissão”.
44.
Chegamos a uma parte do Juramento que
causa muito celeuma, qual seja aquela em que se jura“não usar
a talha mesmo sobre um calculoso confirmado; deixarei essa tarefa aos práticos
que disso cuidam”.
Os
críticos entendem que jurar por tal proceder, diante da medicina moderna, não
se justifica. No entanto, tais críiticos desconhecem que na época de
Hipócrates, o médico era uma coisa e cirurgião era outra. Na atualidade, nem
todo médico é cirurgião.
Portanto, não se pode incumbir um médico clínico a
realizar uma cirurgia cardíaca, por exemplo,
diante da evidente imperícia do
médico clínico em realizar tal intervenção
Logo,
a regra moral hipocrática encontra correspondência no Capítuto III do Código de Ética Médica, onde há preceito referennte à
Responabildade Profissional, que veda ao
médico causar dano ao paciente,
por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência.
45.
Outra regra constante do Juramento
prescreve, de acordo com a tradução feita pelo professorAlexandre Corrêa do texto original em grego: “Em quantas casas entrar, fá-lo-ei só para a utilidade dos
doentes, abstendo-me de todo o mal voluntário e de toda voluntária maleficência
e de qualquer outra ação corruptora, tanto em relação a mulheres quanto a
jovens, sejam livres ou escravos”.
Pois
bem, encontramos a correspondência desta regra hipocrática, por analogia, no
art. 38 do Capítulo V – Relação com Pacientes e Familiares: “É vedado ao médico…Desrespeitar o pudor de qualqier pessoa, sob
os seus cuidados profissionais”.
46.
No Juramento está presente, ainda, a
regra moral de que deve o médico “não relatar o que no exercício
do meu mistér ou fora dele no convívio social eu veja ou ouça e que não deva
ser divulgado, mas considerar tais coisas como segredos sagrados”,
ou como consta da versão utilizada na Faculdade de Medicina da USP por muitos
anos:“Guardar segredo que quer que eu veja, ouça ou venha a conhecer no
exercício da Medicina ou fora dele que não deva ser divullgado, considerando a
discrição como um dever”.
A regra é
correlata àquela constante no Capítulo IX – Sigilo Profissional, muito embora o
Códido de Ética Médica “se restrinja ao que o Médico
toma conhecimento em seu exercício profissional”.
Cabe
observar, também, que o Código de Ética Médica determina ser vedado ao
médico “revelar fato que tenha conhecimento em virtude do exercício da
sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento por escrito
do paciente” (art. 73), como lhe é vedado “revelar sigilo profissional relacionado a paciente menor de idade (74)
e “fazer referência a casos clínicos identificáveis, exibir
pacientes ou seus retratos em anúncios profissionais ou na divulgação de
assuntos médicos em meios de comunicação em geral, mesmo com autorização do
paciente” (art. 75).
47.
Neste ponto, cabe recordar que o
juramento de Hipócrates em seu original realça odever de agradecimento aos
mestres que ensinam a arte médica e a obrigação de
transmitir o conhecimento da medicina e as conquistas no tratamento dos
pacientes aos seus filhos.
Trata-se
de um princípio de gratidão – toda gratidão é benfaseja, pois é prova de
caráter – e de outra parte existe o sentido de cooperação a guiar os médicos na partilha de seus
conhecimentos em prol da Medicina.
Aliás,
em texto sob o título “O Novo e Moderno Juramento dos
Médicos”, em que o articulista escreve sobre o IX Congresso Nacional
de Medicina realizado em Coimbra (2017), em que as Fauldades de Medicina de
Portugal (Lisboa, Coimbra, Braga e Porto) adotaram a Declaração de Genebra em
sua versão aprovada pela Associação Médica Mundial em 2017, realça sobre esse
princípio ético o seguinte que o texto “alarga o dever de
respeito não só aos mestres, mas também aos alunos e aos
colegas, reconhecendo o dever de partilha do conhecimento dos médicos em
benefícios aos doentes – algo relacionado com a formação médica conínua e com a obrigação” que
os médicos têm de “partilhar o conhecimento” que
possuem com seus pares, que se
trata de uma questão fundamental da Medicina.[56]
48. Importante ressaltar, por exemplo, que a obra deMachado de Assis, como a de Monteiro Lobato, recentemente caída em domínio público,
devem ser interpretadas após o estudo adequado. Eis porque, “leitores incultos e mal intecionados – enxergam no Juramento o
machismo grego como se fosse machismo médico, ou o respeito aos médicos como
corporativismo, obviamente uma deturpação inaceitável para alguém que domine o
mínimo de metodologia necessária ao ler um documento antigo”. [57]
remate. |
49.
O saudoso e ilustre médico, membro da
Academia Paulista de MedicinaDr. José Pompeu Tomanik,
ao falar sobre o trabalho médico, com rara felicidade, diz ser importante
reconhecer o “trabalho das mãos que trazem os homens ao
mundo, tratam de suas doenças e dos seus familiares, bem como que irão
gratuitamente assinar seu “passaporte” para o outro lado”.[58]
Essa
certeza faz ecoar um brado: “salve tão nobre profissão,
insubstituível para que a Humanidade continue a escrever a sua história para
todo o sempre”.
O
Juramento de Hipócrates escrito a 2.600 anos, como se observou no decorrer
deste pequeno estudo, continua a conter o
cerne de regras éticas para o exercício da nobre profissão da Medicina. Nele se
encontram os predicados exigidos para que existam verdadeiros médicos. Preceitos éticos estes que se
incorporaram aos Códigos de Ética Médica de diversos países, incluindo o
Brasil.
50.
Uma detida refexão, a partir do
estudo ora empreendido, nos conduz a uma certeza: o Juramento de Hipócrates
continua a servir de paradigma ético aos futuros médicos, o que o torna válido
em qualquer época. O Juramento de Hipócrates“é uma obra de arte e
sabedoria, só comparável às mais altas criações do espírito humano e, por isso
mesmo, deve ser considerado patrimônio da humanidade e
permanecer intocável, como um marco na história da medicina”.[59]
Se assim
é, não se pode destruir o texto do Juramento, “criando uma versão falsificada
e inodora, ou distorcer a interpretação e a correta contextualização do
original”.[60]
Portanto,
o importante, mesmo que haja versão reduzida, que se mantenha o cerne dos princípios e das regras éticas
contidos no Juramento de Hipócretes constantes de seu original, princípios e
regras éticas que permanecem atuais, apesar
de decorridos 2.600 anos.
[1] Magistrado aposentado do Tribunal de Justiça
do Estado de São Paulo; advogado; ex-professor assistente de Direito Civil da
Faculdade de Direito de São Paulo; atualizador de obras clássicas do Direito
brasileiro do professor VICENTE RÁO, professor JOSÉ FREDERICO MARQUES e do II
tomo do “Tratado de Direito Privado” de PONTES DE MIRANDA.
[2] –Texto baseado em brilhante artigo do
professor Joffre M. de Rezende publicado na “Revista Paraense de
Medicina”, vol. 17/38-47, consultado em
http//usuários.cultura.com.br/jmrezende.
[4] – Ibidem. Os demais manuscritos
conhecidos são todos dos séculos XIV e XV. Há atualmente na ilha de Kós
uma fundação, a Fundação Hipocrática Internacional de Kós, que é, ao mesmo
tempo, Museu e Centro de Pesquisas sobre a medicina hipocrática. Nesta Fundação
preserva-se um texto idêntico ao que se encontra no livro Ancient
Medicine, de Edelstein, que, por sua vez, o transcreveu da obra Corpus
Medicorum Graecorum, ed. Heiberg, 1927.
[5] –Esclareceu, também, a existência da tradução
inglesa de C. I. Tenkin, do texto alemão de Ludwig Edelstein, bem como a
tradução inglesa do original grego, de W. H. S. Jones, em Hipócrates (1923,
v. I); a tadução italiana, por sua vez é apresentada por Castiglioni, no seu
tratado Storia della Medicina e, por fim, cotejou o texto
publicado pelo professor Flamínio Fávero, no seu livro de Medicina
Legal, uma tradução literal do texto de Hegger.
[6] –
Artigo do professor Joffre M. de Rezende publicado na “Revista Paraense
de Medicina”, vol. 17/38-47, consultado em http//usuários.cultura.com.br/jmrezende.
[7] – Idem. Aqueles que desejarem consultar
as traduções do Juramento em inglês e francês poderão fazê-lo
no site http//usuários.cultura.com.br/jmrezende.
[9] – “É hora de aposentar o juramento de
Hipócrates?”, Medscape, 21 de fevereiro de 2017.
[10] – Muitos médicos afirmam ser contrários
ao Juramento pela invocação de deuses da mitologia grega, que os acadêmicos não
conhecem e muitos nunca ouviram falar. Todavia, este artigo procura demonstrar
que a invocação feita por Hipócrates tem real sentido.
[11] – Juramento de Hipócrates. Revelações
Surpreendentes. Medicina do Estilo de Vida. Há na Ilha de Kós as ruínas de um
templo dedicado a Esculápio e a tradição explica que foi nesse templo que
Hopócrates foi ensinado e treinado nos segredos da medicina.
[12] – “A serpente está relacionada a uma crença grega
ainda mais ancestral, de que as cobras seriam donas de grande sabedoria e
capacidade de regeneração e cura (as cobras trocam de pele “renovando-se”).
Acreditava-se que os mortos iam para “baixo”, para o fundo da terra, num lugar
parecido com um sonho, denominado Hades (e que não é nem bom, nem ruim). As
serpentes manteriam contato com os mortos, e poderiam até transportar a alma de
antepassados que retornariam de baixo para ajudar os vivos. A idéia de que as
serpentes possuem sabedoria provém justamente da crença que elas transportavam
o espírito dos nossos antepassados falecidos”. http://www.medicinadoestilodevida.com.br/hipocrates/
[13] – ALEXANDRE FELDMAN, Juramento de
Hipócrates. Revelações Surpreendentes, http://www.medicinadoestilodevida.com.br/hipocrates/
[14] – Artigo do professor Joffre M.
de Rezende publicado na “Revista Paraense de Medicina”, vol.
17/38-47, consultado em http//usuários.cultura.com.br/jmrezende.
[15] – “É hora de aposentar o juramento de
Hipócrates?”, Medscape, 21 de fevereiro de 2017.
[18] –“É hora de aposentar o juramento de
Hipócrates?”, Medscape, 21 de fevereiro de 2017.
[19] – Idem. A opinião de abandonar o
juramento representa uma minoria, pois a maioria dos participantes
entendeu que seu “valor deva ser eterno“, pois dá aos médicos recém-formados uma idéia a respeito dos
princípios que regem a Medicina e lembra que se está diante de uma profissão
sagrada. O juramento continua sendo “um padrão ético pelo qual todos
deveriam viver, para cuidar e proteger nossos pacientes”.
[20] – Artigo do professor Joffre M. de
Rezende publicado na “Revista Paraense de Medicina”, vol.
17/38-47, consultado em http//usuários.cultura.com.br/jmrezende.
[23] – Artigo do professor Joffre M. de
Rezende publicado na “Revista Paraense de Medicina”, vol.
17/38-47, consultado em http//usuários.cultura.com.br/jmrezende.
[26] – Artigo do professor Joffre M. de
Rezende publicado na “Revista Paraense de Medicina”, vol.
17/38-47, consultado em
http//usuários.cultura.com.br/jmrezende.
[28] – Ibidem. Na parte final da
modificação sugerida, referente à calculose vesical, não se pode deixar de
anotar que a proibição contida no texto original do Juramento existe porque na
época de Hipócrates, médico não era cirurgião, como acontece hoje
em dia, muito embora nem todo médico seja cirurgião e vice-verso.
[29] – Artigo do professor Joffre M. de
Rezende publicado na “Revista Paraense de Medicina”, vol.
17/38-47, consultado em http//usuários.cultura.com.br/jmrezende.
[31] – “Se o médico brasileiro não aprender
direito o que é ser médico e qual o valor da alta cultura (a verdadeira e única
digna do nome, diga-se de passagem), provavelmente será o pequeno burguês de
boas aparências do Juramento de Hipócrates adulterado. Destrua a
verdadeira cultura e a memória da medicina, e nossos médicos alcançarão a
irrelevância frente à sociedade, tornando-se meros burocratas da saúde”.“In” Hélio
Angotti Neto, “A medicina moderna e o assassinato do Juramento de
Hipócrates”.
[32] – Dr. Rafael Ximenes, ilustre médico e
escritor, em estilo de escrever correto e claro, em artigo sob o título “Juramento
de Hipócrates”, discorre sobre a queda de conceito da medicina e o faz, com
a maestria dos justos. Começa por constatar que nenhuma profissão no Brasil
caiu tanto no conceito da opinião pública, nas últimas décadas, como a
medicina. Os reclamos giram, com certa razão, diante da longa espera para se
conseguir marcar uma consulta ambulatorial. No sistema público pode demorar
mais de um ano a depender da região e da especialidade pretendida. Nos planos
de saúde, o tempo é menor, mas pode chegar de semanas a alguns meses.
Reclama-se que os planos de saúde são caros e não cobrem todos os procedimentos
necessários. Critica-se a falta de estrutura das unidades básicas de saúde, o
caos dos prontos-socorros. Ouve-se a dita de que os médicos não examinam seus
pacientes; não escutam suas queixas.
Certamente não são tais reclamações, todas elas injustas, mas lançar a culpa de
tal situação a toda classe médica é injusto e triste. Em primeiro lugar, a
carga horária de trabalho da maioria dos médicos se estende por sessenta,
noventa, até cento e dez horas por semana. Logo, não é sensato atribuir à
falta de disponibilidade do médico a espera a que a população é submetida. Os
médicos atendem e muito, inclusive mais do que deveriam, chagando à exaustão
após horas seguidas de plantão. Apanham por ter cão e por não ter cão, pois se
atendem rapidamente, são criticados por não dar atenção ao paciente; se demoram
na consulta, aqueles que a aguardam reclamam da demora no atendimento. Não é possível dizer-se que no Brasil há um número
insuficiente de profissionais. Segundo a Organização Mundial de Saúde temos
mais médicos do que o necessário. Então, qual a razão de esperar-se tanto por
atendimento? Um dos problemas é a escassez de médicos em algumas especialidades
em contraste com a abundância em outras. Não é difícil entender o motivo: hoje
em dia o valor pago por uma cirurgia de colocação de prótese mamária é maior do
que o de uma cirurgia cardíaca. Reclama-se de pagar um valor ínfimo por
uma consulta, mas paga-se dez mil reais por uma cirurgia plástica, sem qualquer
reclamação. Constitui absurdo que os recém-formados busquem especialidades onde
serão melhor remunerados? Se a sociedade valoriza mais a estética do
que a saúde, a culpa é da classe médica? Outro grande problema
apontado é a má distribuição de médicos entre as diversas áreas do território
brasileiro. O médico não pode ser submetido a condições de trabalho que julgue
inapropriadas, pois poderá ser considerado responsável por prejuízos ao
paciente em falta de recursos para o atendimento. Se determinado local não
tem o número de profissionais de que necessita, deveríamos rever que condições
de trabalho estes lugares oferecem. Querer que o médico vá para onde ele é
necessário e depois responsabilizá-lo pela falta de estrutura é no mínimo
injusto. Portanto, é culpa dos médicos se concentrarem em alguns centros em
detrimento de outros? Acredita-se que os médicos sejam bem remunerados e
quando os mesmos lutam pelo aumento de seus honorários são vistos como
mercenários. Mas trabalhando cento e dez horas por semana, qual profissional
com nível superior não ganharia mais? Se um médico decidir trabalhar as mesmas
quarenta horas semanais de outras profissões (para não citar as que cumprem
metade disto), certamente não ganharia tão bem. Um plano de saúde paga por consulta de vinte a cinquenta reais. Se
considerarmos os gastos com aluguel de consultório, equipamentos de trabalho e
impostos, talvez seja melhor não calcular a remuneração de um atendimento. Mas
dizem que os médicos credenciam-se em planos de saúde porque querem e,
portanto, têm que aceitar o valor que recebem. Porém, quando se discute que não
mais se atenda por tais planos, são acusados de não querer atender a população.
Quer dizer que são obrigados a se sujeitar a empresários com patrimônios
bilionários e que os desrespeitam com remuneração pífia? É por acaso algum
crime querer que depois de seis anos de faculdade, três a seis anos de
residência, alguns com mestrado e doutorado, os médicos queiram receber mais do
que o valor de um corte de cabelo para cuidar e se responsabilizar por vidas?
Não se pode acreditar que sim. Porque se isto for verdade, se a população não
acha que o valor de um médico é superior a vinte reais, então não são os
médicos que faltam com respeito à população. É a população que deveria se
envergonhar de tal postura. Se o valor pago por um plano de saúde é alto, os
clientes têm o direito de reclamar para os planos de saúde, não para o médico. Nas últimas décadas houve um encarecimento da medicina, com o
surgimento de novas tecnologias, passando a ser maior o custo de um atendimento
médico. Certamente, a qualidade também melhorou, pelo menos para quem tem
acesso a tais recursos. Vivemos nas últimas décadas um encarecimento da
medicina. Com o surgimento de novas tecnologias, o custo de um atendimento
passou a ser bem maior. Certamente, a qualidade também melhorou, pelo menos
para quem tem acesso a tais recursos. Ressonância nuclear magnética, testes
genéticos, próteses e órteses, stents coronarianos, anticorpos
monoclonais, para citar alguns exemplos, passaram a integrar o arsenal da
medicina moderna. Tudo isto é muito caro. Os diagnósticos médicos, antes
baseados em história clínica e exame físico, hoje podem exigir exames que
custam de centenas a milhares de reais. E os pacientes muitas vezes exigem que
tais exames sejam feitos, mesmo sem saber se são indicados para aquele caso. É
freqüente ouvirmos que “o médico não pediu nenhum exame” como algo negativo,
como sinal de incompetência ou negligência. Se o custo de exames complementares
encarecem a medicina quando bem indicados, imaginem quando usados de forma
indiscriminada. Mas solicitando vários exames, todos ganham. Os médicos são bem
vistos, os pacientes ficam satisfeitos, os donos das máquinas nem se fala. Só
não devemos esquecer de que bolso virá o dinheiro. Por outro lado, há aqueles que necessitariam de
procedimentos de alto custo e que não tem acesso aos mesmos. Limitar a medicina
moderna àqueles que têm dinheiro, não me parece justo. Da mesma forma que não
acho justo que muitos não tenham acesso à alimentação, segurança, educação e
moradia. Mas não vejo ninguém dizer que os advogados deveriam defender as
pessoas por vinte reais, que os agricultores são mercenários por quererem
vender a comida a quem tem fome ou que os engenheiros deveriam construir casas
para os desabrigados sem nada cobrar e pagando do seu bolso os materiais de
construção. Quer dizer que só os médicos são culpados pelas mazelas da sociedade?
E mesmo que o médico abrisse mão de sua remuneração, quem vai pagar os exames,
remédios, internações? Nesta conta, o honorário médico é o que menos pesa. Dito tudo isto, acho que a resposta para a minha pergunta é
não. Os médicos não são os únicos culpados pelo alto custo da medicina, pela
demora do atendimento aos pacientes, pela exclusão de uma grande parcela da
população a um atendimento de ponta. Antes de tudo, assim como a população,
somos vítimas. Por fim, muitos podem
criticar este texto por ter sido focado em custos, dinheiro, reconhecimento, ao
invés de falar de características que a profissão médica deveria ter, como
humanismo, dedicação, humildade, caridade. Não posso deixar de reconhecer que,
assim como em outras profissões, hoje estas qualidades faltam a parte da
categoria médica. E disto nós temos culpa e, neste ponto, devemos um pedido de
desculpas à população. Acho inadmissível o fato
de que existam médicos que hoje nem sequer fazem um exame clínico completo e
bem feito, que cedem às pressões para um atendimento rápido e em escala, que
pedem exames sem necessidade apenas para não perder tempo explicando para o
paciente as indicações e riscos de cada procedimento. Envergonho-me ao ver
colegas tratando de forma diferente as pessoas por serem atendidas pelo SUS ou
em consultórios particulares, em presenciar a indiferença diante do sofrimento
alheio. Certamente acho que a medicina deva ser uma profissão humanitária, que
o médico deva se preocupar em atender a população carente, e não apenas os mais
abastados. Mas acho que merecemos mais respeito e reconhecimento ao fazê-lo.
Talvez isto não passe de nossa obrigação, do juramento que fizemos ao
nos formar, como muitos gostam de lembrar nestes momentos. Mas em um país onde
a maioria não cumpre os seus deveres, onde promessas feitas hoje são esquecidas
amanhã, é um grande mérito ter palavra. E para quem não conhece o juramento de
Hipócrates, sugiro que o leiam antes de citá-lo, para que não incorram em erro
por ignorância. Como na maioria dos relacionamentos,
seja entre irmãos, amigos, pai e filho, homem e mulher, quando as coisas não
vão bem, os dois lados tem sua parcela de responsabilidade. Não adianta
procurarmos um culpado. E não é diferente na relação médico-paciente. Se
chegamos ao desgaste atual, é hora de cada parte rever sua postura. Só assim
voltaremos àquilo que é o desejo de todos: uma medicina bela e eficiente,
caridosa e reconhecida, trabalhosa e recompensada, difícil, mas, acima de tudo,
que leve alívio àqueles que sofrem, vida onde há incerteza e consolo onde este
se faz necessário. Que assim seja.
[33] -“Apud”
VICENTE RÁO, “O Direito e a Vida dos Direitos”, Ed. RT, S.Paulo, 3ª. ed., 1991,
revista e atualizada por OVÍDIO ROCHA BARROS SANDOVAL, vol. I, nota 9 ao nº
20, pg. 47.
[35] –
“Filosofia do Direito”, Amado Editora, Coimbra, 1961, vol. I, pg.116.
[36] –
JOSÉ RENATO NALINI, Ética Geral e Profissional, ed. Revista dos
Tribunais, S. Paulo, 10ª ed., 2013, n. 1.2, pg. 12.
[39] –
JOSÉ RENATO NALINI, Ética Geral e Profissional, ed. Revista dos
Tribunais, S. Paulo, 10ª ed., 2013, n. 1.2, pgs. 14/15.
[41] –
MIGUEL REALE, “O Código de Ética Médica”, “Rev. dos Tribs.”, vol.503, pg.51.
[43] –
“Derecho Administrativo”, Ed. La Ley, Buenos Aires, 6ª ed., 1965, tomo IV,
nº.806, pg. 291.
[45] –
“apud” MIGUEL REALE, “Rev. cit. , pg. 51.
[46] –
“Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado”, vol. V, São Paulo,
Livraria Francisco Alves, 1.957, 10ª edição, p. 252.
[47] –
“Código do Consumidor Comentado”, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1995,
p. 139.
[48] –
“Jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo”, Ed. Lex, vol. 229/90.
[49] –
Teresa Ancona Lopes de Magalhães, “Responsabilidade Civil dos Médicos”, ‘in’
“Responsabilidade Civil”, coordenação de Yussef Said Cahali, São Paulo,
Saraiva, 1988, 2ª edição, n. 2, p. 319.
[50] –
cf. JTJ – Lex – 142/117; cf. também JTJ – 134/153.
[52] – “Enciclopédia Saraiva do Direito”,
Ed. Saraiva, S. Paulo, ed. 1977, vol. I, nota 10 à pg. 465.
[53] – “Direito Penal”, Ed. Forense,
Rio, 1ª ed., 1966, tomo 4º, pg. 172
[54] – Ob. e tomo cits., pgs. 173/174 e
nota 12.
[55] – Artigo do Professor WALTER MORAES
publicado na Revista de Jusrisprudência do Tribunal de Justiça de São
Paulo “RJTJSP”, vol. 99/20-29
[56] Encontrado em HTTPS//medicin.com/@MadreMedia.
[57] Helio Angotti Neto, “A Medicina
Moderna e o Assassunato do Juramento de Hipócrates”.
[58] – “Juramento de Hipócrates”, Suplemento
Cultural de janeiro de 2009 da Associação Paulista de Medicina.
[59] – Artigo do professor Joffre M. de
Rezende publicado na “Revista Paraense de Medicina”, vol.
17/38-47, consultado em http//usuários.cultura.com.br/jmrezende.
[60] -Helio
Angotti Neto, “A Medicina Moderna e o Assassunato do Juramento de
Hipócrates”.
Fonte: https://www.fmrp.usp.br/pb/arquivos/3652#:~:text=%E2%80%9C%20Prometo%20solenemente%20consagrar%20a%20minha,ser%C3%A1%20a%20minha%20primeira%20preocupa%C3%A7%C3%A3o.
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