Jesus Cristo desceu aos infernos, ressuscitou dos mortos no terceiro dia
Jesus desceu às profundezas da terra. Aquele que desceu é também aquele que subiu (Ef 4,9-10). O Símbolo dos Apóstolos confessa em um mesmo artigo de fé a descida de Cristo aos Infernos e sua Ressurreição dos mortos no terceiro dia, porque em sua Páscoa é do fundo da morte que ele fez jorrar a vida:
Cristo, teu Filho,
que, retomado dos Infernos,
brilhou sereno para o gênero humano,
e vive e reina pelos séculos dos séculos. Amem.
PARÁGRAFO I
CRISTO DESCEU AOS INFERNOS
As freqüentes afirmações do Novo Testamento segundo as quais Jesus ressuscitou dentre os mortos (1Cor 15,20) pressupõem, anteriormente à ressurreição, que este tenha ficado na Morada dos Mortos. Este é o sentido primeiro que a pregação apostólica deu à descida de Jesus aos Infernos: Jesus conheceu a morte como todos os seres humanos e com sua alma esteve com eles na Morada dos Mortos. Mas para lá foi como Salvador, proclamando a boa notícia aos espíritos que ali estavam aprisionados.
A Escritura denomina a Morada dos Mortos, para a qual Cristo morto desceu, de os Infernos, o sheol ou o Hades, Visto que os que lá se encontram estão privados da visão de Deus. Este é, com efeito, o estado de todos os mortos, maus ou justos, à espera do Redentor que não significa que a sorte deles seja idêntica, como mostra Jesus na parábola do pobre Lázaro recebido no “seio de Abraão. São precisamente essas almas santas, que esperavam seu Libertador no seio de Abraão, que Jesus libertou ao descer aos Infernos. Jesus não desceu aos Infernos para ali libertar os condenados nem para destruir o Inferno da condenação, mas para libertar os justos que o haviam precedido.
A Boa Nova foi igualmente anunciada aos mortos… (1Pd 4,6). A descida aos Infernos é o cumprimento, até sua plenitude, do anúncio evangélico da salvação. É a fase última da missão messiânica de Jesus, fase condensada no tempo, mas imensamente vasta em sua significação real de extensão da obra redentora a todos os homens de todos os tempos e de todos os lugares, pois todos os que são salvos se tomaram participantes da Redenção.
Cristo desceu, portanto, no seio da terra, a fim de que os mortos ouçam a voz do Filho de Deus e os que a ouvirem vivam (Jo 5,25). Jesus, o Príncipe da vida, destruiu pela morte o dominador da morte, isto é, O Diabo, e libertou os que passaram toda a vida em estado de servidão, pelo temor da morte (Hb 2,5). A partir de agora, Cristo ressuscitado detém a chave da morte e do Hades (Ap 1,18), e ao nome de Jesus todo joelho se dobra no Céu, na Terra e nos Infernos” (Fl 2,10).
Um grande silêncio reina hoje na terra, um grande silêncio e uma grande solidão. Um grande silêncio porque o Rei dorme. A terra tremeu e acalmou-se porque Deus adormeceu na carne e foi acordar os que dormiam desde séculos… Ele vai procurar Adão, nosso primeiro Pai, a ovelha perdida. Quer ir visitar todos os que se assentaram nas trevas e à sombra da morte. Vai libertar de suas dores aqueles dos quais é filho e para os quais é Deus: Adão acorrentado e Eva com ele cativa. “Eu sou teu Deus, e por causa de ti me tornei teu filho. Levanta-te, tu que dormes, pois não te criei para que fiques prisioneiro do Inferno: Levanta-te dentre os mortos, eu sou a Vida dos mortos.
RESUMINDO
Na expressão Jesus desceu à mansão dos mortos, o símbolo confessa que Jesus morreu realmente e que, por sua morte por nós, venceu a morte e o Diabo, o dominador da morte. (Hb 2,14)
O Cristo morto, em sua alma unida à sua pessoa divina, desceu à Morada dos Mortos. Abriu as portas do Céu aos justos que o haviam precedido.
PARÁGRAFO 2
NO TERCEIRO DIA RESSUSCITOU DOS MORTOS
Anunciamo-vos a Boa Nova: a promessa, feita a nossos pais, Deus a realizou plenamente para nós, seus filhos, ressuscitando Jesus (At 13,32-33). A Ressurreição de Jesus é a verdade culminante de nossa fé em Cristo, crida e vivida como verdade central pela primeira comunidade cristã, transmitida como fundamental pela Tradição, estabelecida pelos documentos do Novo Testamento, pregada, juntamente com a Cruz, como parte essencial do Mistério Pascal.
Cristo ressuscitou dos mortos.
Por sua morte venceu a morte,
O TÚMULO VAZIO
Maria de Mágdala e as santas mulheres, que Vinham terminar de embalsamar o corpo de Jesus, sepultado às pressas, devido à chegada do Sábado, na tarde da Sexta-feira Santa, foram as primeiras a encontrar o Ressuscitado. Assim, as mulheres foram as primeiras mensageiras da Ressurreição de Cristo para os próprios apóstolos. Foi a eles que Jesus apareceu em seguida, primeiro a Pedro, depois aos Doze. Pedro, chamado a confirmar a fé de seus irmãos, vê portanto, o Ressuscitado antes deles, e é baseada no testemunho dele que a comunidade exclama: E verdade! O Senhor ressuscitou e apareceu a Simão (Lc 24,34).
Tudo o que aconteceu nesses dias pascais convoca todos os apóstolos, de modo particular Pedro, para a construção da era nova que começou na manhã de Páscoa. Como testemunhas do Ressuscitado, são eles as pedras de fundação de sua Igreja. A fé da primeira comunidade dos crentes tem por fundamento o testemunho de homens concretos, conhecidos dos cristãos e, na maioria dos casos, vivendo ainda entre eles. Estas testemunhas da Ressurreição de Cristo são, antes de tudo, Pedro e os Doze, mas não somente eles: Paulo fala claramente de mais de quinhentas pessoas às quais Jesus apareceu de uma só vez, além de Tiago e de todos os apóstolos.
Diante desses testemunhos é impossível interpretar a Ressurreição de Cristo fora da ordem física e não reconhecê-la como um fato histórico. Os fatos mostram que a fé dos discípulos foi submetida à prova radical da paixão e morte na cruz de seu Mestre, anunciada antecipadamente por Ele. O abalo provocado pela Paixão foi tão grande que os discípulos (pelo menos alguns deles) não creram de imediato na notícia da ressurreição. Longe de nos falar de uma comunidade tomada de exaltação mística, os Evangelhos nos apresentam discípulos abatidos, com o rosto sombrio (Lc 24,17) e assustados. Por isso não acreditaram nas santas mulheres que voltavam do sepulcro, e as palavras delas pareceram-lhes desvario (Lc 24,11). Quando Jesus se manifesta aos onze na tarde da Páscoa, censura-lhes a incredulidade e a dureza de coração, porque não haviam dado crédito aos que tinham visto o Ressuscitado” (Mc 16,14).
Mesmo confrontados com a realidade de Jesus ressuscitado, os discípulos ainda duvidam, a tal ponto que o fato lhes parece impossível: pensam estar vendo um espírito. Por causa da alegria, não podiam acreditar ainda e permaneciam perplexos (Lc 24,41). Tomé conhecerá a mesma provação da dúvida e quando da última aparição na Galiléia, contada por Mateus, alguns, porém, duvidaram (Mt 28,17). Por isso, a hipótese segundo a qual a ressurreição teria sido um produto da fé (ou da credulidade) dos apóstolos carece de consistência. Muito pelo contrário, a fé que tinham na Ressurreição nasceu – sob a ação da graça divina – da experiência direta da realidade de Jesus ressuscitado.
O ESTADO DA HUMANIDADE RESSUSCITADA DE CRISTO
Jesus ressuscitado estabelece com seus discípulos relações diretas, em que estes o apalpam e com Ele comem. Convida-os, com isso, a reconhecer que Ele não é um espírito, mas sobretudo a constatar que o corpo ressuscitado com o qual Ele se apresenta a eles é o mesmo que foi martirizado e crucificado, pois ainda traz as marcas de sua Paixão. Contudo, este corpo autêntico e real possui, ao mesmo tempo, as propriedades novas de um corpo glorioso: não está mais situado no espaço e no tempo, mas pode tornar-se presente a seu modo, onde e quando quiser, pois sua humanidade não pode mais ficar presa à terra, mas já pertence exclusivamente ao domínio divino do Pai. Por esta razão também Jesus ressuscitado é soberanamente livre de aparecer como quiser: sob a aparência de um jardineiro ou de outra forma (Mc 16,12), diferente das que eram familiares aos discípulos, e isto precisamente para suscitar-lhes a fé.
A Ressurreição de Cristo não constituiu uma volta à vida terrestre, como foi o caso das ressurreições que Ele havia realizado antes da Páscoa: a filha de Jairo, o jovem de Naim e Lázaro. Tais fatos eram acontecimentos miraculosos, mas as pessoas contempladas pelos milagres voltavam simplesmente à vida terrestre “ordinária” pelo poder de Jesus. Em determinado momento, voltariam a morrer. A Ressurreição de Cristo é essencialmente diferente. Em seu corpo ressuscitado, Ele passa de um estado de morte para outra vida, para além do tempo e do espaço. Na Ressurreição, o corpo de Jesus é repleto do poder do Espírito Santo; participa da vida divina no estado de sua glória, de modo que Paulo pode chamar a Cristo de o homem celeste.
A RESSURREIÇÃO COMO ACONTECIMENTO TRANSCENDENTE
A Ressurreição de Cristo é objeto de fé enquanto intervenção transcendente do próprio Deus na criação e na história. Nela, as três Pessoas Divinas agem ao mesmo tempo, juntas, e manifestam sua originalidade própria. Ela aconteceu pelo poder do Pai que ressuscitou (At 2,24) Cristo, seu Filho, e desta forma introduziu de modo perfeito sua humanidade – com seu corpo – na Trindade. Jesus é definitivamente revelado Filho de Deus com poder por sua Ressurreição dos mortos segundo o Espírito de santidade (Rm 1,4). São Paulo insiste na manifestação do poder de Deus pela obra do Espírito que vivificou a humanidade morta de Jesus e a chamou ao estado glorioso de Senhor.
O Filho opera, por sua vez, a própria Ressurreição em virtude de seu poder divino. Jesus anuncia que o Filho do homem dever sofrer muito, morrer e, em seguida, ressuscitar (sentido ativo da palavra). Alhures, afirma explicitamente: Eu dou a minha vida para retomá-la… Tenho poder de dá-la e poder para retomá-la (Jo 10,17-18 Nós cremos… que Jesus morreu, em seguida ressuscitou (1Ts 4,14).
A verdade da divindade de Jesus é confirmada por sua Ressurreição. Dissera Ele: Quando tiverdes elevado o Filho do Homem, então sabereis que EU SOU, (Jo 8,28). A Ressurreição do Crucificado demonstrou que ele era verdadeiramente EU SOU, o Filho de Deus e Deus mesmo. São Paulo pôde declarar aos judeus: A promessa feita a nossos pais, Deus a realizou plenamente para nós…; ressuscitou Jesus, como está escrito no Salmo segundo: Tu és o meu filho, eu hoje te gerei (At 13,32-33). A Ressurreição de Cristo está estreitamente ligada ao mistério da Encarnação do Filho de Deus. E o cumprimento segundo o desígnio eterno de Deus.
Há um duplo aspecto no Mistério Pascal: por sua morte Jesus nos liberta do pecado, por sua Ressurreição Ele nos abre as portas de uma nova vida. Esta é primeiramente a justificação que nos restitui a graça de Deus, a fim de que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também nós vivamos vida nova (Rm 6,4). Esta consiste na vitória sobre a morte do pecado e na nova participação na graça. Ela realiza a adoção filial, pois os homens se tornam irmãos de Cristo, como o próprio Jesus chama seus discípulos após a Ressurreição: Ide anunciar a meus irmãos (Mt 28,10). Irmãos não por natureza mas por dom da graça, visto que esta filiação adotiva proporciona uma participação real na vida do Filho Único, que se revelou plenamente em sua Ressurreição.
A fé na Ressurreição tem por objeto um acontecimento ao mesmo tempo historicamente atestado pelos discípulos que encontraram verdadeiramente o Ressuscitado e misteriosamente transcendente, enquanto entrada da humanidade de Cristo na glória de Deus.
O sepulcro vazio e os panos de linho no chão significam por si mesmos que o corpo de Cristo escapou às correntes da morte e da corrupção pelo poder de Deus. Eles preparam os discípulos para o reencontro com o Ressuscitado.
Cristo, primogênito dentre os mortos (Cl 1,18), é o princípio de nossa própria ressurreição, desde já pela justificação de nossa alma, mais tarde pela vivificação de nosso corpo.
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